O que é um Anti-Vilão?
Anti-herói todo mundo conhece, mas e anti-vilão? Ele vem crescendo nas histórias junto com o anti-herói, você já deve tê-lo visto por aí, mas será que sabe usá-lo?
Todos já ouvimos falar de anti-heróis, certo?
O anti-herói é aquela versão sombria do herói que é capaz dos atos mais vilanescos para conseguir atingir seu objetivo. Porém, apesar dos métodos usados (matar, torturar, roubar doces de crianças, etc) o objetivo final dele é sempre algo bom como derrotar o vilão ou salvar o mundo. Esses heróis, na perspectiva do público, são complexos e cheios de nuances, pois estão dispostos a tudo para atingir seu objetivo final.
E como o oposto do anti-herói seria chamado? Aquele vilão que não é totalmente maligno, que pararia para ajudar uma idosa a atravessar a rua enquanto planeja como explodir metade da cidade. Ele parece ser bom, mas seus objetivos finais, não.
Isso é o que chamamos de anti-vilão. Se você acha que um anti-herói é complexo, tente entender como funciona um anti-vilão.
O que é um vilão afinal?
Em primeiro lugar, vamos separar o vilão do antagonista. Muitas histórias usam o vilão como o antagonista da narrativa, mas isso nem sempre é necessário. O antagonista, nem sempre é o vilão.
Imagine que o objetivo do protagonista é vencer um torneio, mas o antagonista quer a mesma coisa, seja pela mesma motivação ou não. O antagonista não é o mal encarnado, ele não planeja a destruição de uma cidade ou tem um grande plano maligno. Ele é apenas o obstáculo que o protagonista precisa superar em sua jornada, e não um vilão a ser impedido.
Um vilão é um cara mau. Um gênio do crime que deseja dominar o mundo é, definitivamente, um vilão. Contudo, muitos poucos vilões são simplesmente maus hoje em dia. Na verdade, um dos únicos lugares onde você ainda encontra esses vilões de pura maldade é na fantasia épica, onde eles frequentemente aparecem como algum tipo de força misteriosa das trevas ou do caos. Fora nesse contexto, eles são apresentados de forma satirizada pela sua maldade sem justificativa em obras de comédia ou desenhos animados.
Os tons de cinza estão surgindo nesse maniqueísmo, em ambos os lados. A ascensão do anti-herói surgiu simultaneamente à ascensão do anti-vilão nas narrativas.
Você poderia ter um cara mau que é apenas um vilão, e mesmo assim dar alguma característica para que os seus leitores possam simpatizar e até mesmo gostar dele. Há um personagem na série Rick and Morty chamado Krumbopulus Michael, que mesmo sendo um assassino alienígena, é extremamente simpático. "Prazer em conhecê-lo, Morty. Ouça, se você precisar que alguém seja assassinado, por favor, me ligue. Sem código de ética. Eu mato qualquer um, em qualquer lugar — crianças, animais, idosos, não importa. Eu simplesmente amo matar."
O fato de um vilão ser engraçado ou simápatico aos leitores não o torna menos vilanesco. Assim como ser alguém bom não significa necessariamente ser gentil, e ser gentil, não significa necessariamente ser bom. Talvez o tipo mais comum de vilão simpático (carismático ao leitor) seja aquele descrito no site tvtropes.org como "Woobie, Destroyer of Wolrds". (algo com “O Coitado, Destruidor de Mundos”). A ideia aqui é que, se você atribuir uma história bem trágica a um personagem fará com que os leitores sintam pena do vilão, justificando seus atos terríveis e fazendo com que ele pareça menos vilanesco.
Se você não conhece o site, recomendo muito que vá lá dar uma olhada. É um compêndio incrível de tropos, não só de TV. Infelizmente só existe em inglês.
Sim, é trágico que a família do vilão tenha sido morta em um revolta popular, mas isso não justifica que o plano de vingança do vilão seja a aniquilação de toda a população de uma nação.
Então, temos antagonistas, vilões comicamente sombrios, vilões com profundidade, vilões que gostamos, vilões pelos quais sentimos pena — todas essas são abordagens divertidas para dar aos nossos vilões um pouco de profundidade. Mas estes não são anti-vilões.
O anti-herói pode ser sombrio e cruel; ele pode fazer coisas ruins, mas, no final, ele quer algo bom e se esforça para alcançá-lo, o que o torna um herói. Por outro lado, embora os anti-vilões possam ser agradáveis ou até fazer coisas boas, no fim das contas, eles querem algo ruim, o que os torna verdadeiros vilões.
No fim, tudo se resume aos objetivos. Os métodos e motivações por trás desses objetivos podem mudar, mas, no final, é o resultado do que o personagem faz ou tenta fazer que define sua moralidade. Thanos, do Universo Cinematográfico da Marvel, é um excelente exemplo disso.
Ele quer salvar o universo. E seu objetivo, em termos claros, é assassinar metade de todos os seres vivos no universo de uma só vez. Então, embora ele possa ser motivado por um ideal bom, seu objetivo final é maligno. Ele é um vilão, apesar de possuir um ethos estranhamente altruísta.
É isso que um anti-vilão parece ser. Embora, provavelmente, seja a versão mais simplificada que você pode encontrar: um grande homem roxo maligno que quer matar metade dos seres vivos do universo. Mas talvez isso não seja tão ruim — não é um grande dilema moral aí.
Se um vilão é um personagem com objetivos que entendemos como ruins, então existem dois tipos de anti-vilões: um com um objetivo maligno, mas boas motivações; e outro com um objetivo maligno, mas bons métodos. Certamente seria mais fácil se eles tivessem nomes, não é?
Felizmente, temos o site tvtropes.org para nos ajudar. O noble demon (“nobre demônio”) é basicamente um vilão com algum tipo de código de ética ou honra que ele segue. Para este tipo de anti-vilão, o fim nem sempre justifica os meios. Seu objetivo pode ser maligno, mas seus métodos são mais criteriosos, mais honrados do que os de outros vilões. Pense em um mafioso de filme cheio de regras de conduta, mas que no final não deixa de ser um criminoso perigoso.
No filme Predador, de 1987, um caçador alienígena chega à Terra em busca de presas dignas. O filme segue um grupo de soldados testosteronicamente musculosos em uma missão que os leva às profundezas de uma selva quente e úmida. Contudo o alienígena não ataca qualquer um, pois o que ele busca são adversários dignos e a “mulher indefesa” (ela, ao contrário dos soldados, não anda armada) que ele encontra não é o alvo digno que ele busca.
Eventualmente, perto do clímax do filme, um dos veteranos musculosos e exalando testosterona prova ser um oponente à altura. Quando desafiado para um combate mano a mano, o alienígena enfrenta o homem, guerreiro contra guerreiro, descartando suas armas e armaduras futuristas. Um assassino implacável, sim, mas com um código de honra — ele só luta contra adversários dignos. Um tipo de anti-vilão? Sim, mas bem raso.
Mas e quando tanto meios empregados quanto o objetivo final são ruins, mas a motivação é boa? Esse é o território do outro tipo de anti-vilão: o extremista bem-intencionado. Thanos, tecnicamente, se encaixa nesse papel, mas acho que há outro vilão que demonstra isso de forma muito mais sutil.
Na primeira temporada da série A Lenda de Korra, somos apresentados ao grande vilão, um enigmático e poderoso personagem mascarado chamado Amon, que ameaça destruir o status quo. E, de certa forma, ele tem razão. Veja, o mundo em que eles vivem tem dois tipos de pessoas: os Dobradores e os não-Dobradores. Pessoas que podem manipular magicamente os elementos — terra, vento, fogo e água — e pessoas que não podem.
Amon é o líder dos igualitários, uma facção política que busca tornar Dobradores e não-Dobradores iguais. Ele quer que todos se sintam seguros uns com os outros e tenham as mesmas oportunidades. Uma causa nobre, certo? Mas, como Thanos, isso é apenas sua motivação. Seu objetivo real é tirar à força os poderes de todos os Dobradores. E, se esse objetivo por si só já não fosse ruim o suficiente, o método que ele usa para alcançá-lo é igualmente vilanesco: sequestrar pessoas, aterrorizar a população e armar sua própria força paramilitar.
Com esse contexto, ele se torna um vilão bastante claro, certo? Ele quer algo ruim e está disposto a fazer coisas ruins para consegui-lo. Mas sua motivação idealista e virtuosa, tecnicamente, o torna um anti-vilão.
E podemos ver o quão delicado é esse equilíbrio se ajustarmos apenas alguns detalhes. E se ele quisesse algo bom? Por exemplo, e se, em vez de retirar à força os poderes dos Dobradores, seu objetivo fosse aprovar leis para proteger os não-Dobradores e lhes conceder direitos iguais? E se ele usasse os mesmos métodos sombrios — sequestros e terrorismo — para alcançar esse objetivo? De repente, ele se tornaria um anti-herói?
Os domínios do anti-herói e do anti-vilão são tão próximos que, às vezes, é apenas uma questão de perspectiva. Alguém que você considera um anti-herói pode facilmente parecer um anti-vilão se você simplesmente mudar o ângulo por ele é visto.
Na quarta temporada de Stranger Things, o personagem Jason busca vingança contra Eddie Munson, o sádico que ritualísticamente assassinou sua namorada, Chrissy. Isso na visão dele dos acontecimentos. Mas o público sabe que, na verdade, Chrissy for morta por um *spoiler* monstro interdimensional. Mas no contexto do personagem de Jason, faz muito mais sentido ter ocorrido um ritual satânico, não é mesmo?
É fácil ver Jason como um anti-vilão, mas e se pensássemos o mesmo que ele? Se não soubéssemos a verdade e só tivéssemos as mesmas informações que ele? Uma única peça de informação muda completamente a narrativa.
Jason provavelmente não estaria fazendo nada disso se soubesse a verdade. Então, ele pode realmente ser considerado o vilão? Ele é um anti-vilão puramente porque nós sabemos algo sobre a situação que ele não sabe, e não por algo que ele realmente tenha feito.
Isso é comum nos anti-vilões.
Os segredos e motivações de Severus Snape foram mistério ao longo da maior parte da série Harry Potter. Mas provavelmente sabe que ele *spoiler* mata Dumbledore, e também sabe que ele era um dos mocinhos o tempo todo. Mas se você tivesse acesso apenas aos primeiros seis livros, quase certamente ainda classificaria Snape como um anti-vilão.
E se a cena no sétimo livro, onde Harry descobre a verdade sobre Snape, não tivesse acontecido? Todos os fatos continuariam os mesmos até então, mas a opinião de Harry sobre ele seria bem diferente. E como vemos a histórias através dos olhos de Harry, teríamos a mesma percepção.
Um anti-vilão é bastante complexo de ser desenvolvido, mas extremamente recompensador quando funciona, tornando-se um personagem memorável para a história. Kylo Ren poderia ter sido redimido? Quando Walter White passou de um anti-herói desajeitado para um vilão completo? Tyler Durden era um demônio ou a sombra necessária que ele teve de enfrentar para crescer?
Essa é a força de um anti-vilão, você não põe a moralidade do vilão em cheque, você se coloca no lugar dele e é a sua moralidade que é questionada.
Eu tenho um fraco pelo anti-vilão! Acabo sempre chorando com sua triste história e concordando que ele acabe com metade do mundo!
É claro que seguido da frase: "Só não concordo com a forma que ele fez isso!"
O Daemon, de House of the Dragon, seria um anti-vilão? Tô achando que sim